sábado, 28 de junho de 2008

MEU NOVO ROMANCE




Chegou com um ar de quem se predispõe a aceitar qualquer penitência, conquanto a mais do que certa censura do Governador caísse sobre ele com a força de um raio salvador para apagar esse cúmulo negro de mágoas físicas e espirituais. Tinha a pele opaca e curtida com o desmazelo próprio das doenças vorazes, os olhos castanhos enegrecidos por sucessivas doses de insónia e o cabelo espigado como setas de ouriço-cacheiro mirim. Estava vestido com um toque de espírito antigo : calças de caqui, jaqueta cor púrpura, sapatos salvos uma e outra vez por meias solas reforçadas, e um lenço na lapela com o odor indecifrável do orvalho. Os seus movimentos, da respiração aos ademanes, pareciam os de um humano metido no esqueleto frágil de um fantasma, mas essa era apenas uma ilusão brutal, enganadora, sem sentido, pois atribuir a Dom Beneditto a destreza de um duende ou qualquer outro espírito esquivo das trevas, seria sobrelevar aquele triste estado de absoluta falência de método e ideias .


Sem comentários: